20 outubro 2010

O futuro de uma ilusão, de Sigmund Freud


Editora Delta, Rio de Janeiro, 1959

É o texto sobre as funções da crença religiosa da humanidade depois de sua experiência do abandono edênico, segundo todas as genealogias judaico-cristãs. É a profissão de fé de Freud num futuro de supremacia da razão e da verdade científica como meio de libertar o homem de sua condição originária de desamparo natural. Escrito em 1927, o texto dá continuidade à tese da horda primitiva exposta em Totem e Tabu de 1913 e segue a onda de questionamento usual das religiões típica da tradição romântica. Assim como Marx já havia declarado em 1844, que a religião era o ópio do povo, Freud vai demonstrar que a religião é “a neurose obsessiva universal da humanidade” , que depende de sentimentos infantis não resolvidos de expiação da culpa pela morte do pai primitivo, bem como seus dogmas são apenas uma forma de ilusão de segurança e proteção contra as vicissitudes da vida, uma expressão eloqüente da atrofia intelectual da maior parte dos seres humanos.

Desprezando qualquer diferença entre os conceitos de cultura e civilização, Freud a define como toda sorte de criação e construção material e imaterial da humanidade com o fim de tentar livrá-la do estado de natureza como ameaça perene à sua sobrevivência e fonte maior de seu sofrimento. Tal qual a própria organização religiosa, a fraternidade da coesão social é advinda diretamente da coerção social, da renúncia dos impulsos do instinto individual e da aceitação dos limites da lei como garantia de segurança de todos.

Embora não tenha imaginado a que ponto de agressividade e destrutividade o homem alcançaria com a ascensão do fascismo e do nazismo, Freud já criticava a ilusão comunista da revolução russa de 1917. Independente do estágio civilizatório que até então tenha alcançado, o homem conseguiria sobrepujar os desejos instintivos do incesto e do canibalismo, mas ainda não os da ânsia de matar e de roubar seus semelhantes. As religiões teriam um importante papel de frear tais instintos, mas com relativos graus de sucesso em diferentes épocas e lugares. Freud aponta, ao lado das religiões, as próprias artes como forma de alívio e de compensação simbólica pelas pesadas renúncias instintivas que o homem se impõe fazer para manter a vida civilizatória.

Neste sentido, liberal que é, e seguidor do contratualismo hobesiano, Freud é mais iluminista do que a tradição socialista de Rousseau e Marx. Pois não acredita na construção ideal do Estado como Deus possível e pai sublimado, nem tampouco na sua futura eliminação quando do alcance do estágio mais avançado da fraternidade comunista, mas o toma como amargo paliativo de coerção e coesão social, o chamado mal necessário. Ao contrário de uma tradição positivista, por exemplo, Freud afirma que a ciência é o último estágio de desenvolvimento da humanidade, ultrapassando os estágios primitivos da religião e da metafísica. No lugar da ferramenta da crença religiosa e da especulação filosófica vai propor a psicanálise como método imparcial de investigação humana e um novo campo de saber para a compreensão da alma humana e de suas relações com a própria vida social. Mas a função do direito enquanto método de busca da justiça entre os homens não compreende a prática religiosa, que Freud alude. Direito este que busca em Deus ou no testemunho sagrado, senão o próprio sentido ou inspiração da justiça, pelo menos a fonte de expressão da coerção legal. É o que Freud irá explorar em outro texto polêmico e o último de sua vida Moisés e o monoteísmo, de 1938.

Mas um dos momentos altos do Futuro de uma Ilusão é quando Freud recorre a um diálogo consigo mesmo, tratando-se na terceira pessoa, como a se questionar com mais rigor sobre os fundamentos de sua crença racionalista de que a ciência, enfim, superará a religião na explicação e superação do desamparo humano.

Acesse o texto completo em:
http://www.scribd.com/doc/31041716/Sigmund-Freud-O-Futuro-de-uma-Ilusao-O-mal-estar-na-civilizacao-e-outros-trabalhos-rtf