28 dezembro 2011

1822, de Laurentino Gomes



1822, de Laurentino Gomes
Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2010

Este novo best-seller do jornalista e pesquisador Laurentino Gomes acompanha a excelência estilística do primeiro, 1808. O autor consegue resgatar a narrativa histórica brasileira do pedantismo historiográfico da academia e nos coloca num verdadeiro thriller. Como todos sabemos da existência de uma enorme demanda por conhecimento do país, uma busca de entendimento de nossa identidade, fica claro o sucesso das obras do autor que já beiram um milhão de exemplares vendidos. Marca digna de países mais educados e que põe por terra a alegação de que pouco se lê no Brasil e que livros de boa qualidade não vendem.
Tal qual 1808, que tratava da transferência da corte portuguesa para o Brasil e a elevação da colônia a reino, o atual livro, 1822, também se limita a um grande episódio marcante para a compreensão de nossa história, a independência do império de Portugal. O que nos faz antever que o autor permanecerá nesta técnica de recorte preciso de um ano-marca da história, como até mesmo já se espera o próximo título 1889 sobre a proclamação da república. Não bastasse isto, nos brinda com um texto da mais precisa modernidade, claro, conciso, inteligente, factual, uma vez que o cultivou em anos de trabalho de redação jornalística. Laurentino, no entanto, nos dá mais! Uma rara concepção de jornalismo a partir da própria concepção do registro da história que jamais idealiza como neutro, mas sempre “como uma construção mitológica que refaz o passado para justificar lutas e bandeiras políticas do presente” (entrevista a Folha Ilustrada abaixo). Diríamos que o próprio mito da imparcialidade do jornalismo, muito em voga nos grandes veículos da atualidade, fica em cheque diante desta corajosa observação. Daí por diante, a narrativa segue um ritmo frenético de desmistificação dos considerados “fatos irrefutáveis” da historiografia clássica. Diríamos melhor, romântica. Mas jamais moderna, como Laurentino nos apresenta. A começar pela desconstrução do imaginário social sobre o episódio do grito do Ipiranga, com D. Pedro montado numa mula, com dor de barriga, e não garboso naquele alazão pintado em 1888 por Pedro Américo na tela O Grito do Ipiranga, tela considerada por sua fez um pastiche da tela Napoleon à Friedland do pintor francês Jean-Louis Ernest Meissonier, de 1875.
Por outro lado, o autor não deixa de enaltecer a figura-chave de nosso primeiro império que foi D. Pedro, como quando chama a atenção para a magnitude da constituição por ele outorgada em 1824, de cunho liberal, com a instituição do poder moderador que até hoje não teve uma alternativa a altura pelas demais constituições ditas republicanas. Entre as seis, onde cinco são republicanas, foi inclusive a mais longeva constituição brasileira. Fica aqui esta valiosa reflexão sobre a falta de limite claro de nossos poderes republicanos, um invadindo a seara dos demais, sem uma instituição que interceda para estabelecer limites, como até hoje a lei, que deveria ser igual para todos, como prescreve o artigo 5º da atual constituição cidadã, é confundida com privilégios os mais descabidos.
E o autor cita o artigo 98, § 6, da constituição de 1824: “O Poder Moderador é a chave de toda a organização politica, e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos”.
Não bastasse esta inadiável reflexão, não nos esqueçamos que o próprio D. Pedro foi o compositor romântico do Hino da Independência, aquele que fala que já raiou a liberdade no horizonte do Brasil.
Vale muito a pena ler de uma só vez:

http://www.laurentinogomes.com.br/livro.php?id=2171
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/800334-laurentino-gomes-diz-que-1822-e-candidato-natural-a-virar-minisserie.shtml