06 novembro 2013

A conexão entre corrupção e péssimos serviços públicos



Desde que as manifestações começaram em julho, temos percebido que a cidadania começa a fazer a necessária conexão entre a corrupção reinante e o sucateamento de serviços públicos essenciais, como transporte de massa, segurança, saúde pública e educação básica. Uma boa medida dessa percepção são os cartazes “vândalos são os políticos” que têm aparecido com frequência nos protestos. Urge, todavia, à cidadania atuante mostrar clara e definitivamente à sociedade como a
 
ineficiência de políticas públicas e a associação delituosa entre políticos, gestores públicos e empresas como Alstom, Siemens, Delta e tantas outras, afetam diretamente a qualidade de vida dos cidadãos das grandes cidades brasileiras.
Apenas no caso Alstom, a empresa é acusada de ter pago perto de 7 milhões de dólares em propinas para obter um contrato de 45 milhões de dólares na expansão do metrô de São Paulo. Perto de 15%, ou seja, para cada 10 vagões em um trem urbano comum, pelo menos um e meio não chega a existir, desviado pela corrupção. Segundo o Ministério Público de São Paulo, entre os anos de 2000 e 2007, foram desviados perto de 450 milhões de reais da construção de linhas do metrô e de trens de São Paulo. E aí? Nossos governantes e seus fornecedores andam de metrô? E mesmo os distintos membros do Ministério Público andam de trem?
E sem falar nos subsídios fiscais pontuais e ineficientes, e que deixam a sociedade entre a cruz e caldeirinha. Nas contas do consultor de infraestrutura Adriano Pires, um verdadeiro exemplo de cidadão atuante, a política pública de privilegiar o transporte individual, zerando a CIDE e reduzindo impostos como o IPI para a indústria automobilística, fez o Tesouro Nacional deixar de arrecadar cerca de R$ 30 bilhões desde 2008. O suficiente para a construção do tão falado trem-bala entre Rio e São Paulo, para não falar da ampliação das malhas metroviárias das duas maiores metrópoles brasileiras.
Esse volume gigantesco de dinheiro público desperdiçado - além da falta de regulação e fiscalização - tem reflexo direto na vida dos cidadãos. Um deles é o próprio preço das passagens urbanas, a queixa-base desde as manifestações de junho. Segundo dados do site mobilize.org.br, o custo médio das passagens de ônibus das seis maiores cidades brasileiras é o segundo mais caro dentre 22 metrópoles em todo o mundo. Dentre as doze malhas metroviárias mais extensas no mundo, nossas duas maiores, São Paulo e Rio de Janeiro, ocupam as duas últimas colocações. Muito pouco para a sétima maior economia do planeta.
Essa violência contra o cidadão na política pública dos transportes de massa é um massacre a olhos vistos. Diariamente os noticiários dão conta de casos de megaengarrafamentos, superlotação, panes e acidentes dos mais variados tipos. Um processo que começa a ser percebido agudamente pela sociedade, e até manifestado com violência no caso dos polêmicos “black blocs”, o que proporciona um perigoso clima de instabilidade social, e até mesmo a ameaça de anomia do Estado.
Falta a discussão mais urgente e necessária: propostas de soluções objetivas e eficientes. E que necessariamente devem passar pela reinvenção da política, pela transformação da relação entre políticos, agências reguladoras, empresas e sociedade. Em recente declaração pública, o ex-presidente Lula questiona a atuação dos black blocs que vandalizam o patrimônio público e privado escondidos sob suas máscaras, dizendo que sempre fez política de cara limpa, culpando a mídia profissional que desmoraliza a atividade política. Já seu companheiro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, pondera que a mera repressão policial não resolve e que devemos conhecer melhor as motivações dos grupos do quebra-quebra. Enquanto seu colega do Ministério da Justiça, o deputado José Eduardo Cardozo, propõe uma comissão especial de investigação de atos de vandalismo com representantes da área de segurança pública federal e estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro. Diante de tanta hesitação e decisões contraditórias, resta ao cidadão comum indagar se não seriam estas mesmas as causas de exacerbação das manifestações.
Afinal, o enviezamento esquerdista predominante em nossa prática política tem priorizado as funções sociais de um Estado provedor de direitos sociais ilimitados em detrimento direto de seu desempenho nas funções clássicas de garantir a segurança pública e arbitrar os conflitos naturais entre os cidadãos. Uma cultura política atravessada de cinismo, clientelismo, patrimonialismo, impunidade, violação legal, violência social, tolerância e relativização de valores morais. Que, para além da insuflação das massas populares com a demagogia do “Brasil de todos”, só poderá ser superada por uma maior participação de verdadeiros agentes de cidadania, que, com conhecimento especializado em políticas públicas das mais diversas áreas, possam gerar propostas viáveis, suprapartidárias e divulgadas para a devida qualificação do debate público com os cidadãos eleitores, numa verdadeira campanha de educação cívica e política. Para que não votem em cores ou bandeiras, ocos slogans da marquetagem eleitoreira dos mesmos políticos profissionais de sempre, mas sobretudo em propostas objetivas de novas políticas públicas, mais de estado do que de governos, mais de plenos cidadãos eleitores do que de eleitos.
Veja mais no link de nosso novo programa de Agentes de Cidadania em http://www.avozdocidadao.com.br/detailConteudo.asp?ID=2&SM=2%231
Publicado no Diário do Comércio de São Paulo em 1/11/13