17 maio 2009

De Cive, Thomas Hobbes

Numa conjuntura onde se discute cada dia mais a função, importância e tamanho do Estado, enquanto instrumento de afirmação da cidadania, e não como fator de sua alienação política ou mesmo opressão, é fundamental nos voltarmos para os clássicos pensadores do iluminismo. “There is no word without sword”, segundo Hobbes (1588-1679), é a lei fundamental do contrato social. O que o coloca como precursor do próprio Rousseau (1712-1778), na medida em que o Estado, enquanto armado do poder da espada, é o único meio que o homem tem como garantia dos contratos, de sua palavra, e manutenção da paz pela espontânea abdicação de sua liberdade natural. Embora sua obra mais conhecida tenha sido O Leviatã, de 1651, já nesta obra De Cive (Do cidadão), de 1640, Hobbes, fugindo da República de Cromwell, fundamenta sua concepção monarquista do poder político na medida em que a legitimidade do monarca está na vontade do povo, fonte de sua soberania, e não na vontade de todos os cidadãos, que ele chama de simples habitantes da cidade, multidão, sem o necessário compromisso com a autoridade do rei e os destinos da nação. Com relação a John Locke (1632-1704) que o sucede, Hobbes lhe prenuncia a idéia de governo pelo consentimento, embora Locke limite o contrato do rei pela preservação das liberdades civis, da vida e da propriedade individuais. Mas é com Hobbes que se inaugura o iluminismo inglês e alemão dos séculos XVI e XVII, em resposta ao Renascimento italiano dos séculos XIV e XV e do vindouro iluminismo francês dos séculos XVII e XVIII. Nunca é demais nos lembrar que a Revolução Gloriosa inglesa, que depõe e limita o poder absoluto da monarquia no século XVII, só terá seu equivalente francês um século depois, em 1789, com a Revolução Francesa, enquanto a Alemanha jamais será unificada por um regime monárquico absoluto. Se a lei natural do homem é a autopreservação, é o contrato social feito através do Estado forte que evita a guerra de todos contra todos. Mas Hobbes vai mais longe e explica inclusive a diligência do trabalho e a emergente acumulação da riqueza capitalista com o ambiente pacífico criado pela força da espada e da lei do Estado monárquico. Como precursor do liberalismo, Hobbes também contradiz este poder do Estado monárquico quando define que os motivos do homem na vida em sociedade é o lucro ou a glória; não propriamente o amor ao próximo, mas sobretudo o amor por si mesmo: vivemos em sociedade, não por amor aos demais, mas por medo de todos. No De Cive, Hobbes estabelece as leis relativas ao contrato social e as próprias leis da natureza. Fundamenta a tradição da lei civil tanto no direito romano, a partir da lei das 12 tábuas, como na lei mosaica da Torá judaica; tanto o “não faças ao próximo aquilo que não queres que te façam a ti”, do código civil romano, como o “amarás o teu Deus acima de todas as coisas” (entendendo-se Deus como a própria “palavra de Deus” ou a própria Justiça do primeiro mandamento judaico que marca a Antiga Aliança) e, por fim, o “amarás o teu próximo como a ti mesmo” da Nova Aliança cristã. Hobbes também é o primeiro pensador político a nos alertar quanto aos perigos de deterioração das três formas de governo: a monarquia que pode degringolar para a tirania, a aristocracia que pode se degradar para oligarquia, e a própria democracia que pode se deturpar para anarquia ou demagogia. Antes de Montesquieu (1689-1755) pregar a separação dos poderes, podemos pressentir em Hobbes as próprias tendências monárquica, oligárquica e demagógica, respectivamente dos poderes executivo, judiciário e legislativo. Pois cabe à monarquia sobretudo a manutenção da espada, dos exércitos e da segurança dos cidadãos, como última palavra sobre a guerra. Como cabe a aristocracia judiciária a manutenção da paz pela arbitragem dos conflitos, quebra de contratos e transgressões legais. E finalmente às assembléias legislativas, a administração dos governos que é essencialmente a gestão da economia, a arrecadação dos impostos e a destinação das riquezas.
Por fim, vale remarcar que Hobbes inaugura o iluminismo na filosofia inglesa pois, apesar de fundamentar a lei civil à lei natural ditada pela religiões da tradição judaico-cristã, não subordina o poder monárquico ao direito divino dos reis, mas sim na soberania do povo pela manutenção consentida do contrato social.
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