31 agosto 2010

Vincere, o filme


Vincere, de Marco Bellocchio
Uma superprodução filmada como uma verdadeira ópera dramática e extremamente moderna e romântica. Quando histórias afetivas e políticas se encontram na biografia de um líder carismático. Assim como cenas atuais e produzidas com requinte realista são entremeadas de cenas de documentários de época com maravilhosos detalhes de tratamento de direção de arte modernista e futurista. Vide por exemplo a tipologia usada nos letreiros, os adereços das bandeiras e panfletos de propaganda e agitação políticas, a trilha sonora grandiosa e as citações da arte e do manifesto futurista de Marinetti.
Sinopse: a narrativa revela um segredo na vida de Benito Mussolini (Filippo Timi): uma mulher, Ida Dalser (Giovanna Mezzogiorno), e um filho, Benito Albino, que nasceu, foi reconhecido, e em seguida renegado. É uma página negada e ignorada da história da Itália e na biografia oficial do Duce. Quando Ida conhece Mussolini em Milão, ele é um fervoroso socialista que pretende conduzir as massas contra a Igreja e a monarquia. Ela acredita nele e em suas ideias e vende tudo o que tem para financiar Il Popolo d`Italia, um jornal que Mussolini funda e que servirá como núcleo do futuro Partido Fascista. Quando a Primeira Guerra Mundial irrompe, ele se alista no Exército e desaparece. Ao reencontrá-lo algum tempo mais tarde casado com outra mulher, Ida exige seus direitos como verdadeira esposa e mãe de seu filho primogênito. Levada à força, fica trancada por mais de 11 anos em um asilo de loucos, onde é amarrada e torturada, e nunca mais verá seu filho.
Célebre é a citação de Mussolini sobre a dupla negação da Igreja Católica e da aristocracia industrial italiana: “Com as tripas do último papa iremos estrangular o último rei.” Assim como a raiz anarquista do próprio fascismo na célebre divisa de Blanqui: - Quem tem arma, tem pão!
Na verdade o enredo do filme é a convergência histórica do socialismo com o romantismo, não pelo seu fim, uma vez que o socialismo se trata de uma concepção política e o romantismo essencialmente estética. Mas não podemos descuidar da semelhante natureza de ambas visões-de-mundo voluntaristas, egocêntricas, emocionalmente exacerbadas, apaixonadas e comprometidas mais com os movimentos de rupturas e contraposições do que o equilibrado e harmonioso classicismo. Nesta época estão a surgir os elementos essenciais das revoluções políticas e culturais: a imprensa independente, o cinema (ainda que mudo) com imensa força expressiva, a extrema audácia da música atonal, o desassombro da pintura abstrata e as exposições de artes plásticas, as sociedades filarmônicas e o comércio das galerias; o voto universal, o anticlericalismo e a emancipação feminista. Uma menção importante também é o avanço da psiquiatria e a denúncia de seu uso como arma política. Tudo contribui para a emergência do republicanismo e do surgimento da consciência de cidadania na sua expressão política a mais independente. Vale a pena se deliciar com o exuberante painel dos mais variados elementos de uma produção de época que há muito não se via.

Site oficial e trailers: http://www.ifcfilms.com/films/vincere
http://www.youtube.com/watch?v=JPHj_pp3a48
http://www.youtube.com/watch?v=XeaRJxJcp7E&NR=1&feature=fvwp

09 agosto 2010

Freud y su concepción político-social, Paul Roazen


Pensador também se dedicou ao dilema da liberdade e da lei

Este ensaio do pensador e historiador norte-americano da psicanálise Paul Roazen (1936 – 2005) aborda tópicos da filosofia política presentes nas obras culturais do criador da psicanálise, tais como religião e religiosidade, agressão e agressividade, autoridade e poder, penas, castigos e coesão social, bem como o dilema da liberdade e da lei, o que nos leva a indagar do que teria Freud realmente extraído da tradição contratualista da filosofia política de autores como Rousseau e John Locke para quem inexistia contradição entre a liberdade e a lei. Mas muito pelo contrário, a lei seria a própria garantia das liberdades individuais.

Os ensaios sobre a agressividade humana são elaborados a partir de uma troca de correspondência entre Freud e o cientista Einstein em ambos os momentos do impacto de ocorrência da primeira e segunda guerras mundiais. Neste particular, inclusive, Freud chega a prever a necessidade de criação de uma autoridade supra-nacional para arbitrar os conflitos inter-nacionais, como uma ONU que seria fundada apenas em 1945. As referências aos mitos da horda original do Totem e Tabu e do sentimento de culpa pelo parricídio do Mal-estar na civilização dão conta das origens da lei e coesão social. É a resposta de Freud à indagação de Gustave Le Bom sobre a deterioração da ação social humana em face mesmo da sua ação individual. Para Freud se trata de uma regressão infantil da vida em sociedade pela dolorosa experiência da horda original que não permitirá – pela instituição do remorso e da proibição do incesto e do assassinato – que o lugar do pai possa ser ocupado por um indivíduo tentado a usurpar o gozo do poder sobre os demais. De uma concepção genealógica sobre a coesão social em Totem e Tabu e Mal-estar na civilização, Freud vai evoluir para uma concepção propriamente psicanalítica da vida social em Psicologia das massas e análise do eu, onde a relação política básica consistia numa relação erótica, da massa com a autoridade, dos filhos disputando com o pai o amor da mãe.

Mas o evento político que definiu propriamente a concepção política de Freud foi a Revolução Russa, uma vez que os revolucionários foram intransigentes para com a psicanálise enquanto uma visão enfática da subjetividade humana. A partir da perseguição da psicanálise em 1929, Freud declara o comunismo incompatível com seu pensamento. Se no Futuro de uma ilusão Freud vai assinalar as crenças religiosas como uma deliberada recusa ao amadurecimento do homem, e mesmo de seu equilíbrio psíquico, não deixará de incluir nessas crenças as ideologias políticas que galvanizaram os corações europeus dos anos 20 e 30. O que torna sua visão política surpreendente ao se imaginar que, embora morte em 1939, ainda viveríamos mais sessenta anos (até 1989) para o convencimento geral da insustentabilidade de um muro de Berlim e, junto com ele, das bases podres de um estado Leviatã.

Sobre a vida de Freud veja:
http://www.youtube.com/watch?v=yrbHMI3yshI&feature=related