30 novembro 2010

Filosofia política em Eric Voegelin


Dos megalitos à era espacial
de Manedo Castro Henriques

Eric Voegelin (1901-1985) foi um dos maiores filósofos do século XX, sobretudo no âmbito da cultura saxã. Muito pouco conhecido na área de influência da cultura latina, é auspicioso que seja introduzido na lusofonia pelo professor da Universidade Católica de Lisboa Mendo Castro Henriques. Eric Voegelin nasceu em Viena e se tornou professor de ciência política da faculdade de direito quando, em 1938, perseguido pela Gestapo, teve que fugir para a Suíça e depois para os Estados Unidos, onde obteve a cidadania americana. Durante a sua vida publicou mais de 30 livros, dos quais se destacam a monumental História das Idéias Políticas e Ordem e História, este já traduzido para o português. Um dos seus livros mais conhecidos e que lhe rendeu a perseguição nazista foi exatamente Hitler e os alemães, onde aprofunda as razoes histórico-culturais da suicida aventura nazista. Eric Voegelin passa a construir uma solida obra de reflexão sobre a desrazão das ideologias dominantes no século XX como o nazismo, o comunismo soviético, o fascismo etc. Mas sua maior crítica é sem dúvida a Karl Marx, cuja ideologia denuncia como uma leitura deturpada de Hegel, uma vez que, quando a realidade entra em conflito com Marx, ele descarta a realidade. O panorama da historia das idéias políticas em Voegelin parte das ordens sobre as quais são construídas as sociedades humanas: desde a ordem cosmológica da era dos megalitos, passando pelas ordens antropológica, teológica, de estados nacionais, à nova ordem das poliarquias. Para Voegelin, o momento decisivo é o século VI a.C. quando surgem, nos quatro cantos do planeta, pensadores que transformam a perspectiva cosmológica em antropológica propriamente dita: desde Confúcio, na China, passando por Sidarta, na Índia, por Zaratustra, na Pérsia e os grandes profetas israelitas, até os pensadores da filosofia grega da passagem da mitologia para a epistemologia. Desmistifica, portanto, a tese materialista de que a historia dos conflitos humanos se move pela luta de classes e suas ideologias, quando na verdade são as idéias que fazem mover a marcha da historia pela sua própria manifestação. Para a passagem da ordem teológica para a ordem dos estados nacionais, Voegelin se fixa na passagem do ano de 1516 para 1517, quando surge a reforma protestante de Lutero, na Alemanha, antecedida pela publicação de pelo menos três grandes obras da filosofia política iluminista: O Príncipe de Maquiavel, A Utopia de Thomas More e O Elogio da Loucura de Erasmo de Rotterdam. Todos tratam de pensar a ordem do estado como meio de se alcançar a convivência pacífica e segura entre os homens e a própria democracia como ideal político. Só a democracia é determinada pelas condições históricas e culturais de cada sociedade que a persegue, sendo que Voegelin aponta sempre três fatores para sua manutenção: elites democráticas convictas do valor da liberdade e da dignidade humanas, um sistema eleitoral livre e transparente e programas e propostas de governo claras e verdadeiras. Uma constituição, por exemplo, e como no caso inglês, segundo Voegelin, pode-se escrever em seis meses. Já um sistema político-eleitoral e partidário livre e transparente, pode-se levar seis anos. Já uma elite política verdadeiramente democrática, que não caia na tentação totalitária das tiranias ou oligarquias, pode levar até 60 anos, ou mais de duas gerações para a sua construção. E sua idéia de nação como um conjunto de bens gratuitos como as tradições, a língua, ou a própria idéia de povo e de cidadania, é determinante para a consecução da democracia, para além de uma paródia à tese da inexistência de almoço grátis de Milton Friedman, como a libertação da política do imediatismo da economia. Mas a maior contribuição de Voegelin à filosofia política contemporânea se dá na sua concepção da república enquando politéia. Aliás, a própria República de Platão se intitulava em bom grego antigo de Politéia exatamente por que não tinha esta concepção de ordenamento jurídico institucional que nos foi passada pela tradição romana, onde já se privilegiava a visão governamental sobre a da cidadania, dos legistas e juristas sobre a da assembléia de cidadãos. Politéia neste sentido implica na ação política do cidadão, exatamente o que nos faltou na tradição republicana. O que torna essencial o pensamento da filosofia política de Voegelin para o enriquecimento do debate da cidadania e do seu papel de elite condutora do processo democrático.
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http://www.erealizacoes.com.br/default.asp
http://www.voegelinview.com/
http://www.youtube.com/watch?v=M1GtdcD9Ibk
http://www.youtube.com/watch?v=54UyHB2qncY&feature=channel_page%3E%3Ca%20href=