04 julho 2013

O que cabe às minorias

“É necessário reforçar os fins morais da educação e estimular, na minoria, a missão de esclarecer os demais.” Ortega y Gasset

No que se refere à cultura política nacional, o grande desafio dos tempos vindouros será o teor das respostas que a classe política dará às manifestações. Composta na sua maioria dos mesmos políticos fisiológicos da base do governo, e que agem como se nada tivessem a ver com o despertar da cidadania política dos jovens, não assumem a responsabilidade política de que a nação precisa. Sequer admitem que a horda de vândalos infiltrada nas manifestações pacíficas é produto imediato da anomia do Estado, da pré-falência das instituições ou da certeza da impunidade reinante por interesse desses mesmos políticos. Além de produto mediato da corrupção dos valores morais de uma esquerda romântica social-democrata e de uma esquerda gramsciana e pragmática instaladas no poder em associação direta com a oligarquia política que há décadas rouba o erário. Tudo isto em nome de uma cínica governabilidade que periga vir a se chamar de ingovernabilidade a qualquer momento.

Longe de representar a maioria dos cidadãos brasileiros, que são genuinamente ordeiros, crentes e conservadores, esta aliança nefasta das esquerdas com os políticos corruptos é a verdadeira causa das manifestações e depredações. Das manifestações pelo fato de trinta partidos políticos estarem há décadas a perverter os valores da democracia em rede nacional de rádio e televisão, e ainda por cima às custas de dinheiro público, quando prometem direitos ilimitados contra nenhuma responsabilidade política. Das depredações por que o que os vândalos destroem nas ruas é o mesmo patrimônio público que veem ser saqueado pelos políticos impunes nas denúncias diárias dos telejornais. Não cabe, pois, às massas uma cidadania política propositiva, uma vez que a natureza de sua cidadania é por definição rebelde e solidária apenas. Quando os políticos não representam mais os cidadãos eleitores, cabe à minoria dos cidadãos mais conscientes, empreendedores e pagadores de impostos, a maior missão da cidadania política, qual seja o exercício do controle social sobre os mandatos dos governantes, o funcionamento eficaz das instituições, a revisão das prioridades dos orçamentos públicos e, sobretudo, a formulação de novas propostas de políticas públicas. Fora isto, a convulsão social!

É claro que é injustificável a depredação do patrimônio público! Mas também é injustificável a impunidade de políticos que desviam reiteradamente o dinheiro público por conta de uma relação fisiológica com o poder e uma corrupção generalizada dos próprios valores fundamentais da democracia. Há tantos vândalos depredando a coisa pública nas ruas quanto dentro do Congresso Nacional! A questão é saber como a minoria dos cidadãos conscientes conseguirá convencer a maioria dos omissos quanto à urgência de afastar e punir a minoria dos vândalos. "Nenhum partido nos representa", portanto, não é uma bandeira política de todo sem sentido. É a expressão mais legítima do esgotamento de uma prática política nefasta e repudiada pela cidadania brasileira! As tarifas do transporte público, por exemplo, são apenas uma chave para mudanças em toda política pública de mobilidade urbana do país, sempre feita à revelia dos cidadãos usuários e pagadores de impostos, mas em conluio com as empresas concessionárias do setor. Quem quiser entender a verdadeira motivação das manifestações dos jovens, visite as redes sociais e constate a sua descrença para com a classe política, o clamor contra os partidos de aluguel, a desilusão dos “partidos dos corações partidos” e o ativismo em movimentos sociais multicêntricos, inorgânicos e plurideológicos, mas que não vivem às custas de fundos públicos apropriados pelos mesmos clãs de oligarcas imorais de sempre. 

O discurso demagógico generalizado das últimas décadas não corrompe apenas as massas, mas os próprios valores da democracia e da cidadania, da vida, da igualdade, da liberdade, da propriedade, da moralidade e da justiça. E quanto mais a grande mídia cobre as transgressões generalizadas em face da ordem e da lei, menor o espaço para as condenações da justiça, menor o discernimento entre democracia e demagogia, maior o baixo nível da atividade política no imaginário social do país. Liberdade é corrompida como licenciosidade sem o limite da lei. Cidadania como reivindicação de direitos sociais ilimitados, sem jamais as contrapartidas dos deveres políticos e cívicos. Igualdade perante a lei foi corrompida pela inatingível quimera da igualdade social. A propriedade foi corrompida como usurpação coletiva e não como produto do trabalho. A vida mesma, valor maior dentre todos os valores humanos, foi corrompida pelas alegadas condições de vida. E a justiça, razão de ser maior do estado, se corrompeu no populismo da justiça social. Quando todos sabem que a responsabilidade é o preço do livre-arbítrio! E ninguém é livre se não responde por suas escolhas, a necessária condição da liberdade. Como a própria lei que no Brasil é desprovida de senso moral ou moralidade pública.

Quando o presidente da Câmara, Sr Henrique Alves, afirma que desconhece a motivação dos jovens nas manifestações, demonstra não só a pré-falência da instituição que preside, quanto a própria incompetência para o cargo. O que legitima o abaixo-assinado de 1,5 milhão de  cidadãos pela renúncia de seu comparsa Renan Calheiros, e dá motivo de sobra para que os jovens saiam às ruas. Pois não cabe aos jovens a ação propositiva para as mudanças que estão a exigir. Cabe à minoria dos cidadãos empreendedores e pagadores de impostos se juntar a dezenas de entidades da sociedade civil, que estão a lutar pela reforma política, através da campanha “Eleições Limpas”, defendendo itens essenciais como um novo sistema eleitoral transparente, a proibição de financiamento de campanhas por empresas e outros temas. Cabe, enfim, aos cidadãos formadores de opinião assumer sua responsabilidade política e não permitir que o julgamento da história empacado no Supremo, no lugar de marco de uma revolução em nossos costumes políticos, acabe sendo um estopim para uma convulsão social!