11 março 2013

Eleições limpas: a cidadania no encalço dos políticos

Depois que a sociedade se indignou, foi às ruas e aprovou no parlamento a lei contra acompra de votos em
1999 e a Lei da Ficha Limpa em 2010, agora surge uma nova e decisiva oportunidade de atuação da cidadania: areforma política. Em sequência ao vertiginoso processo que alcançou mais de um milhão e meio de assinaturas pelo impeachment do senador Renan Calheiros, durante esta última quinzena de fevereiro, dezenas de organizações da sociedade civil começaram as discussões sobre que tipo de reforma política é mais objetivo para mobilizar os cidadãos e mais viável para desencadear o processo legislativo. Pois todos já sabemos que o maior problemada democracia é um sistema político de representação em que os mandatos acabam sendo mais dos partidos e dos políticos eleitos do que dos cidadãos eleitores, os verdadeiros donos dos mandatos e que pagam toda a conta dos impostos. E a crise de representatividade é um fenômeno da maioria das democracias ocidentais, vide o movimento 5 estrelas agora nas eleições italianas.


Na última semana de fevereiro, na sede da OAB em Brasília, as 35 organizações que formam o MCCE deram início ao processo de discussões sobre a proposta de reforma política e já chegou a um consenso quanto ao tema central que será o financiamento de campanhas eleitorais, com destaque para a criação de instrumentos legais que proíbam empresas de fazerem doações a candidatos e partidos, um dos grandes focos de corrupção política, como reconhecido por todas as instituições jurídicas e de controle brasileiras, como o STE, o MPF, a CGU, o TCU e outras.A ideia do grupo é reeditar uma grande campanha de coleta de assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular nos mesmos moldes do que foi feito para a Lei da Ficha Limpa. Mas, desta vez, acompanhada também de uma forte movimentação na internet.A expectativa é alcançar ainda neste semestre as um milhão e trezentas mil assinaturas impressas necessárias, dentro da atual legislação, para que um projeto de lei de iniciativa popular possa tramitar no Congresso.

Segundo o juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa,“na primeira reunião para se discutir a Lei da Ficha Limpa, em 2009, compareceram apenas 5 pessoas; agora, já temos de início 35 organizações, representando centenas de entidades e milhões de pessoas em todo o país”. Veja o vídeo do MCCE que já circula na internet com o alerta sobre as consequências de doações ilícitas de empresas às campanhas eleitorais: www.youtube.com/watch?v=cx7Cn6p163s. A grande novidade é que qualquer cidadão pode participar do processode elaboração do projeto de lei, a ser redigido por uma comissão relatora do MCCE, através do emailreformapoliticamcce@gmail.com.

A iniciativa das Eleições Limpas já repercute no Congresso Nacional e o projeto de lei relatado pelo deputado Henrique Fontana (PT-RS), que não tramitava por alegada “falta de consenso”,já passou a ter prioridade. Segundo ele, “para não ser atropelado pelo projeto de lei de iniciativa popular do MCCE”. O próprio presidente da Câmara, Henrique Alves, já confirmou, nesta quinta-feira (28), a votação da reforma política pelo Plenário nos dias 9 e 10 de abril. E os principais pontos que serão colocados em votação: o financiamento público de campanha, a coincidência temporal das eleiçõesmunicipais, estaduais e federais, a ampliação da participação da sociedade na apresentação de projetos de iniciativa popular, inclusive por meio da internet (500 mil assinaturas para a apresentação de um projeto de lei e 1,5 milhão para proposta de emenda à Constituição), nova opção de lista flexível, em que o eleitor continuaria votando no deputado ou no partido, mas só o voto na legenda é que reforçaria a lista apresentada pelo partido e outros itens.

A novidade é que ambos os processos, da coleta de assinaturas da sociedade e da tramitação do PL dos parlamentares, serão mutuamente enriquecedores. Já no primeiro debate dos integrantes da comissão relatora do MCCE, seus membros chegaram ao consenso de que o escopo da proposta de iniciativa popular precisa se ater à proposta de lei, não podendo versar sobre temas que exigem proposta de emenda à Constituição (PEC), já que não há previsão constitucional de iniciativa popular para tal, o que poderia ser usado para barrar o processo.

Na segunda reunião, a comissão avançou no escopo: a proibição do financiamento privado de campanha, em especial por empresas que contratam com a administração pública. O novo modelo de financiamento, porém, exigiria normas claras para aplicação dos recursos que financiarem as campanhas, regras de transparência, prestação de contas na internet e formas de controle público (pelo TSE e TCU) e de controle social pelas organizações da sociedade.

Houve, ainda, avanço nas discussões sobre as formas de democracia direta, uma vez que esta tem sido a grande tendência mundial, com o advento de novas ferramentas e sistemas de internet de participação direta e que podem mudar totalmente o modelo de representação política tradicional. Como aconteceu nas eleições deste ano na Itália com a campanha de Beppe Grillo toda feita pelas redes sociais.Ou em 2011, quando a ativista social Anna Hazare mobilizou 35 milhões de pessoas na Índia, para pressionar os políticos locais a aprovar uma legislação anti-corrupção, usando um sistema de "chamadas não atendidas", através do qual os cidadãos ligavam para um número de telefone e deixavam uma chamada perdida para demonstrar que apoiavam aquela causa.Veja mais em http://www.kickstarter.com/projects/therules/crowdring-a-mobile-organising-tool?ref=live

* Jorge Maranhão é diretor do Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão. Email: jorge@avozdocidadao.com.br